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Banheiros mudam vidas: Embaixadora Choice relata experiência em projeto de impacto da marca Neve

Letícia da Silva é Embaixadora Choice e participou do time de desenvolvimento do projeto.
Com objetivo de gerar conscientização e promoção de melhorias no saneamento básico do Brasil, a empresa Neve e a Unicef firmam uma parceria que inclui a campanha “Metade de Nós”. Dentro do projeto foi lançado o desafio de desenvolver uma solução que ajudasse a sanar a falta de saneamento em uma das regiões com o pior índice do país. Entre os jovens recrutados estiveram presentes três Embaixadoras Choice, entre elas a Letícia da Silva, que nos conta sobre o quão transformadora a experiência se mostrou:
“Se existe uma coisa na qual eu acredito é o poder das conexões. Cada escolha sua te leva a novas oportunidades e assim cada porta que você abre te dá acesso a várias outras. Meu caminho na universidade foi todo assim. Nunca me contentei em fazer o básico, então, logo que entrei na UFPR, em 2011, também entrei na Empresa Júnior. Fiquei quatro anos no Movimento Empresa Júnior e aprendi muito sobre empreendedorismo. Em 2016, meu último ano de faculdade, entrei para o Movimento Choice. E foi essa escolha que me levou a outra experiência incrível: o Desafio Neve.
Eu soube do Desafio através do grupo do Facebook do Choice, do qual somente os Embaixadores participam. Uma Embaixadora postou sobre um projeto da marca Neve em que estavam sendo selecionandos jovens para ficarem imersos em uma casa em São Paulo trabalhando em uma solução de saneamento básico para uma comunidade. Logo de cara me identifiquei e me inscrevi, trabalhar com saneamento básico e impacto social é algo que eu sempre quis. Foram cerca de 1.200 inscritos e 7 jovens selecionados, sendo que, além de mim, outra Embaixadora integrava o grupo, a Sayuri Matsumoto. Ao longo do projeto outra integrante também se tornou Embaixadora, a Natália Vobeto. Além dos 7 selecionados, outro jovem participava do nosso grupo, o Chaguinha, que era representante da comunidade em que o projeto foi implantado, Milagres do Maranhão.
Pra mim foi uma surpresa saber que o projeto seria realizado no interior Maranhão, uma realidade bem distante da minha, que moro em Curitiba. O meu interesse pelo projeto então só foi crescendo. Além de nós, jovens, havia muita gente envolvida no projeto. O desafio na verdade era uma ação do programa Banheiros Mudam Vidas, uma parceria da Kimberly-Clark (a empresa da marca Neve) com a UNICEF. Era um projeto muito maior do que eu havia imaginado.
Em um primeiro momento toda a equipe envolvida no projeto foi conhecer a cidade escolhida. No final de junho de 2016 passamos dois dias em Milagres do Maranhão, uma cidade que fica a 340km de São Luís, na beira do Rio Parnaíba, bem na divisa com o Tocantins. Milagres tem 8 mil habitantes. E desses 8 mil, cerca de metade não tem banheiro em casa. Milagres tem o pior IDH do estado do Maranhão e um dos piores índices de saneamento do Brasil. Mas, quando eu cheguei lá, vi bem além desses números. Desde o começo do projeto nós fomos estimulados a olhar pra cidade sob a perspectiva da abundância. E isso fez toda a diferença. Milagres é uma cidade extremamente acolhedora, com pessoas muito simples, mas muito grandiosas e talentosas. É onde reina uma tranquilidade absurda. Claro, foi um choque conhecer uma realidade em que as pessoas não possuem banheiro, mas nós percebemos que isso era apenas um detalhe na vida de muitas pessoas.
Depois dessa visita inicial, ficamos morando cerca de 40 dias na mesma casa em São Paulo. Recebemos diversas visitas de especialistas da área de saúde, empreendedorismo e tecnologia. Tínhamos também o apoio de nossos mentores: a Aline, engenheira ambiental da Roda Ambiental; o Projeto Caracol, um casal especialista em permacultura e a Acupuntura Urbana, que realiza diversos projetos de mobilização comunitária. Nos dividimos em dois times dentro da casa: um envolvido com a tecnologia de saneamento e design do banheiro, outro envolvido com a mobilização e conscientização da comunidade. Eu fiquei responsável, junto com outros dois engenheiros ambientais, pelo estudo da tecnologia e desenvolvimento do protótipo.
Foi um grande desafio escolher a tecnologia que iríamos implantar, estudamos muitas alternativas existentes e ao fim buscamos, sobretudo, uma tecnologia simples, que fosse possível de ser construída pelos próprios moradores, utilizando recursos locais. Além disso, tínhamos a limitação de fazer um banheiro que custasse até mil reais, o que é bem abaixo do preço de um banheiro convencional. Sendo assim, escolhemos um modelo de banheiro seco chamado Bason. O banheiro seco não é nada mais que um banheiro que não utiliza água, mas sim o princípio da compostagem. O diferencial do Bason é que ao contrário de outros modelos de banheiro seco, o usuário só precisa manusear o composto pronto, sem necessidade de transferência para uma composteira, por exemplo. Isso é possível porque ele é formado por duas câmaras, e em uma delas é onde ocorre a compostagem.
Além do Bason, que é o sanitário em si, o banheiro também é composto por pia e chuveiro. A água da pia é reutilizada para a lavagem do compartimento da urina do Bason, e o tratamento das águas cinzas (pia e chuveiro) é feito por um círculo de Bananeiras, que utiliza o princípio da evapotranspiração das folhas da planta. Resumindo, buscamos um processo que respeita o tempo da natureza e cria um ciclo de renovação dos recursos. A ideia era criar também uma experiência completa aos usuários do banheiro, levando higiene, saúde, conforto e segurança às pessoas.
Durante o período na casa em São Paulo, dedicamos muito tempo para estudar a tecnologia, escolher a comunidade e criar um plano de mobilização e construção dos banheiros. Tivemos pouco tempo para de fato prototipar a solução. Criamos apenas um pré-protótipo. O Bason é feito com placas de fibrocimento, compostas por cimento e uma tela de sombrite (ou saco de ráfia) pra dar mais resistência ao material. Eu nunca tinha trabalhado com cimento na minha vida, então foi um grande desafio entender como era o processo de construção do Bason. Tínhamos um espaço muito pequeno dentro da casa, então nossa oficina de trabalho pra fabricação das placas foi uma cozinha! Colocamos a mão a massa e ao final de nossa imersão construímos nosso primeiro Bason.
Mas ainda faltava muita coisa para o banheiro ficar completo que nós não havíamos testado. Por isso a validação do nosso protótipo foi algo que aconteceu em paralelo com a construção dos mesmos. Para os primeiros banheiros, escolhemos uma comunidade piloto com 16 famílias, a comunidade de Patos. A primeira meta do projeto foi universalizar o saneamento nessa comunidade, onde havia apenas um banheiro.
Sendo assim, em setembro de 2016, concluímos a construção de 5 banheiros em regime de mutirão. Foram ao todo duas semanas de mutirão, uma semana para a preparação e outra semana para a construção e mobilização da comunidade. Na construção do banheiro contamos com ajuda de pedreiros e dos moradores, mas também colocamos a mão na massa, levantando paredes de tijolo de barro (adobe), fabricando placas e montando o Bason, realizando instalações hidráulicas, pintando paredes e por aí vai…
Em paralelo à construção dos banheiros a equipe do projeto também realizou uma gincana na cidade, envolvendo principalmente as crianças. A gincana tinha como objetivo conscientizar a comunidade a respeito da importância do saneamento e hábitos de higiene. Foram realizadas oficinas de fabricação de sabão, distribuição de material de higiene, mutirão de coleta de lixo na beira do rio, entre outras atividades. Além disso, foi feito todo um trabalho anterior à construção dos banheiros para avaliar a aceitação da comunidade a respeito do banheiro. Isso porque a utilização de um banheiro seco vem com o estigma de ser algo retrógrado, mas na verdade é uma das formas mais sustentáveis de se realizar o tratamento dos dejetos, principalmente em áreas rurais.
O entendimento da comunidade sobre o banheiro seco foi algo gradual e na medida em que os banheiros foram construídos e utilizados, a aprovação do modelo Bason foi algo que superou nossas expectativas. Após o mutirão, novos banheiros foram construídos inteiramente pela comunidade, com o acompanhamento esporádico dos mentores. A ideia do projeto sempre foi que os moradores se apoderassem da tecnologia, sendo capazes de construir o banheiro de forma autônoma.
Hoje todos os banheiros da comunidade de Patos foram construídos. Nós, jovens, não temos mais participação ativa no projeto, mas acompanhamos a evolução dos banheiros. Claro que o projeto não foi isento de falhas, mas ao longo do tempo os problemas com a execução e utilização do Bason foram sendo sanados. Nós estudamos muito sobre como tornar o projeto uma ideia de negócio de impacto social, mas nosso maior desafio foi como tornar o banheiro efetivamente um produto, fácil de ser produzido e escalável. Hoje o modelo de banheiro criado é algo que atinge um nível local e tem suas particularidades, pois é feito com recursos locais, e a própria tecnologia do Bason depende de condições ambientais favoráveis.
O que eu posso afirmar é que o Bason tem um grande potencial pra resolver o problema do saneamento principalmente em comunidades isoladas e em áreas rurais. Pode ser que leve 100 anos para que o saneamento básico seja universalizado no Brasil, portanto iniciativas como a da marca Neve são muito importantes pra mostrar que a solução do problema não está necessariamente em tecnologias avançadas, mas sim em inovação social. Saneamento é muito mais um problema de gestão do que de tecnologia.
Essa experiência me mostrou, acima de tudo, como é importante enxergarmos a abundância em lugares onde aparentemente faltam recursos. Além disso, construir algo COM a comunidade, e não PARA a comunidade foi algo que fez toda a diferença. Desde o começo nos preocupamos em entender as necessidades dos moradores e em chegar a uma ideia de banheiro que fosse ao mesmo tempo acessível e culturalmente aceita. Foi uma experiência incrível, que juntamente com o Choice, me fez ter a certeza de que trabalhar com impacto social na minha profissão é o que eu quero pra minha vida!”




